Relato sobre a montagem em 2005 do espetáculo Heart of Gold – One Hundred Years of Solitude sob direção de Hiroshi Koike com a Cia. Pappa Tarahumara baseada em Tokyo – Japão.

Elenco composto por 13 integrantes – 1 ator de Hong Kong (convidado), 3 dançarinos-atores brasileiros (convidados), 1 cantor rapper (convidado), 1 ator japonês (convidado) e 7 dançarinos-atores da Cia. Pappa Tarahumara. 1 compositor americano responsável pela trilha sonora, 1 vídeo-maker brasileira (convidada), equipe de aderecistas e cenógrafos, técnicos de luz e som, figurinista, maquiador, vídeo-maker e equipe de produção da Cia. Pappa Tarahumara.

Foram 8 apresentações com estréia na cidade de Yamaguchi dia 02 de dezembro de 2005 no Yamaguchi Center for Arts and Media e apresentação dia 03. Temporada realizada em Tókio nos dias 07, 08, 09, 10 e 11 de dezembro de 2005 no Setagaya Public Theatre e dia 15 de dezembro na cidade de Tsukuba no Tsukuba Capio Hall.

O espetáculo Heart of Gold – One Hundred Years of Solitude tem duração de aproximadamente 2h15 com 15 minutos de intervalo entre a primeira e segunda parte. Foi concebido inspirado no livro Cem Anos de Solidão de Gabriel Garcia Marques. Sonho acalentado pelo diretor Hiroshi Koike há mais de 25 anos. Realizá-lo significou importante evento tanto no sentido artístico bem como de vida para todos os que vivenciaram esta produção. Trata-se de uma leitura do diretor sobre a obra de Garcia Marques aonde os atores-dançarinos desempenham vários papéis, manipulam objetos em cena, com projeções de imagens utilizando diversos suportes e intensa troca de figurinos e adereços. O espetáculo era representado em japonês, cantonês e português. Havia projeção das traduções do cantonês e português para o japonês. O palco foi construído com uma rampa e grande painel pintado ao fundo do teatro. Há uma harmonia cromática dos figurinos e durante o espetáculo eles vão se tornando, pouco a pouco, brancos. A iluminação extremamente cuidada e detalhada, apenas em azul, variando em intensidades conforme a cena compõe muito bem com o colorido dos figurinos, num linóleo cor de laranja. O roteiro do espetáculo foi subdividido em 10 grandes cenas que se metamorfoseavam em diferentes imagens. O elenco era tão importante quanto os detalhes técnicos do espetáculo, numa eficiente precisão técnica atingida após intensos e exaustivos ensaios.

Foram 45 dias de ensaios com uma folga por semana.
Havia uma escala organizada para o dia, conforme a participação dos atores nas cenas a serem criadas e desenvolvidas. O cronograma era extremamente apertado, muitas vezes, ultrapassando o tempo interno de criação dos atores e os limites físicos dos dançarinos, pois estávamos correndo contra o tempo.
A limpeza do espaço de ensaio era feita pelo elenco. Dividiam-se as responsabilidades aos integrantes da Cia., tais como cuidar da maquiagem, adereços, figurinos, lixo reciclável, etc.
Em todos os ensaios, com rara exceção, passava-se um corrido da peça até a parte criada. No início tivemos que aprender coreografias já elaboradas pelo elenco no Invisibles Cities Dream, espetáculo criado pelo diretor, “work in progress” do Cem Anos de Solidão.
Ao término de nossa residência no estúdio Morishita em Tókio realizamos duas apresentações abertas ao público da primeira parte do espetáculo no modo “work in progress”.
Em seguida, ficamos residentes no teatro do Yamaguchi Center of Arts and Media em Yamaguchi aonde pudemos vivenciar a criação do restante do espetáculo no próprio teatro em que iríamos estrear, permitindo que as experimentações dos detalhes técnicos e espaço cênico fossem feitas. Isto nos deu mais confiança ao longo do processo até a nossa estréia.

Conforme a árvore genealógica dos personagens do livro, re-leitura do diretor, tínhamos mais de um personagem a representar.
Coube a mim, representar Rebeca (sua evolução de criança, a mulher e velha), e Amarata Úrsula, que aparecia ao final do espetáculo, além das cenas de conjunto. Tivemos sessões para aprender a maquiagem dos personagens e as trocas de figurinos, pois os personagens, com o passar do tempo, iam-se transformando ficando mais velhos. As sessões de fotos e filmagem para que a equipe de vídeo pudesse trabalhar com essas imagens projetadas na cena.
Foram muitas as dificuldades a serem superadas, desde o aprendizado de coreografias e atuação característica desta cia. e da direção, pode-se dizer que há muita influência das histórias em quadrinhos japoneses, os tais mangás, misturando figuras esteriotipadas, movimentos como marionetes, humor japonês, alternado por momentos mais densos e profundos, com pouca influência da tradição do teatro clássico japonês. O espetáculo contém dança, contém o teatro, é multi-mídia, é musical, isto faz com que nossa atuação seja completa, não tendo por onde classificar o gênero deste trabalho. O diretor almeja algo novo nas intersecções culturais, outro ponto a se considerar.

Não existem palavras que possam mensurar ou expressar o aprendizado de vida e a riqueza artística desta viagem. Estar morando em outro lugar que não o seu habitual sempre faz nascer perspectivas diferentes de reflexão artística e de vida. Pude vivenciar, de um modo geral, toda a produção de um espetáculo em tempo reduzido, ao modo japonês: nas relações interpessoais, alimentação, língua, ritmo e método aplicado no trabalho de montagem e criação do espetáculo. (2005)

Sites: www.pappa-tara.com

Assista trechos do espetáculo

Na imprensa

Cem anos de solidão. Imprensa japonesa, 2005.