O Poço da Mulher-Falcão – Cassiano Sydow Quilici
A quem poderia interessar, hoje, um teatro metafísico, que aborde a aspiração humana pelo imortal? Cansei de ouvir que o teatro simbolista, de poetas como Yeats, Maeterlink ou Pessoa, não passa de uma estética datada, especialmente para um público que demanda, quase sempre, uma arte explicitamente política.
Mas eis que encontro, na sala do CPT, uma incrível montagem inspirada num velho texto de Yeats, “O Poço da Mulher-Falcão”. E ali estavam vários elementos do teatro simbolista: a penumbra, os coros e danças, as atmosferas, o fino trabalho com a percepção, a evocação do invisível. No entanto, a força e a beleza da encenação devem muito à presença de uma referência central para esses poetas: o teatro Nô. Emilie Sugai e Toshi Tanaka sabem evocar as “personagens-entidades” desse drama lírico, transformando o acontecimento em algo muito além de um mero espetáculo.
Nesse momento, em que circulam temas como “ancestralidade” e “espiritualidade” nos discursos artísticos, trazidos especialmente por artístas indígenas e afro-brasileiros, revisitar a conexão européia-asiática no simbolismo pode nos trazer importantes insights para um outro teatro. (13/12/2023)
Cassiano Sydow Quilici
Professor e pesquisador na Unicamp
Foto: Danilo Cava